Navegar

03/11/2021

Na Folha, Viana explica que todos números são feitos de primos

Ilustração: Pixabay

Coluna de Marcelo Viana, diretor-geral do IMPA, na Folha de S.Paulo:

O enunciado e a prova já apareceram nos “Elementos” de Euclides (c. 300 a.C.) mas são certamente ainda mais antigos: todo número inteiro maior do que 1 pode ser expresso como produto de (um ou mais) números primos, e essa expressão, chamada fatorização, é única se fixarmos a ordem dos fatores. Por exemplo, a fatorização de 60 é 2x2x3x5. Já a fatorização de um número primo, como 17, consiste apenas dele próprio.

Isto significa que os primos são as peças com que são formados todos os números, um pouco como os elementos químicos compõem todas as substâncias. É um dos teoremas mais importantes da matemática e tem inúmeras consequências. Até porque ele não é privilégio apenas dos números inteiros.

Em sua grande obra “Disquisitiones arithmeticae”, publicada em 1801, Carl Friedrich Gauss (1777–1855) usou esse teorema para provar a lei da reciprocidade quadrática, um fato profundo da teoria dos números que Gauss chamava seu “teorema de ouro”.

Três décadas depois, ele voltou ao tema, introduzindo os números da forma m+n√-1 com m e n inteiros, que agora chamamos inteiros gaussianos. Provou que eles também têm a propriedade da fatorização única, e usou esse fato para provar a lei da reciprocidade biquadrática (mais forte que a quadrática).

Mas a propriedade da fatorização única não é sempre verdadeira! Por exemplo, no conjunto dos números da forma m+n√-5, o número 6 pode ser fatorizado em primos de duas maneiras diferentes: 6=2×3=(1+√-5)x(1-√-5).

Para resolver esse problema, em 1847 o matemático alemão Ernst Eduard Kummer (1810–1893) introduziu uma generalização da ideia de primo chamada número ideal, que permitiu obter um teorema geral de fatorização única, para todos os conjuntos de números. A teoria dos ideais tornou-se uma das bases da álgebra abstrata moderna.

A aplicação mais espetacular foi no estudo do “último teorema de Fermat”, que diz que a equação xn+yn=zn não tem soluções inteiras positivas se o expoente n é maior do que 2. Kummer percebeu que o erro de muitas tentativas anteriores de provar esse fato estava no uso equivocado da fatorização única, e usou suas ideias para corrigir a estratégia.

Leia a coluna na íntegra no site do jornal